Simulação de como são recebidos os recuperandos
Uma sociedade acostumada à escalada vertiginosa da criminalidade e do tráfico dificilmente acredita que quem comete delitos pode se recuperar. Porém alunos do MBA em Gestão Empresarial Estratégica da UNIFENAS foram apresentados a uma realidade que envolve pessoas que admitem seus erros, aceitaram pagar por eles, acreditam na sua ressocialização e sonham com um futuro melhor como qualquer outro homem de bem.
“É o amor ao próximo que faz o renascimento da pessoa na sociedade”. Assim definiu Larissa de Ávila Barbosa, aluna do MBA, após visitar e conhecer a realidade que cerca a Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) de Alfenas. Ela e seus colegas puderam acompanhar como é recebido um detento do presídio, que, ao chegar à associação, passa a ser chamado de recuperando. A recepção realizada por outros recuperandos é cercada de depoimentos, emoção, cumplicidade e músicas que valorizam a fé de que voltar ao seio da sociedade exigirá disciplina, cumprimento de normas e a crença de que Deus os acompanha.
O depoimento do recuperando R.C.S. apresentou a Apac como um lugar que, mesmo a que alguns cheguem com a ideia de fugir, percebem que ali poderão cumprir sua pena de forma digna e desistem da fuga; salvo raras exceções. “Começa aqui dentro o trabalho de reintegração na sociedade. O preso vê humildade e carinho dos demais”, afirma.
Na associação, os que estão no regime fechado trabalham o dia todo na fabricação de blocos e ladrilhos para construção, artesanato e outras atividades. Os do semiaberto, que têm carteira registrada, saem para trabalhar e retornam à noite. Ao chegar, passam pelo bafômetro. Há também os recuperandos do regime aberto, que poderiam estar nas ruas, mas, por não terem família ou por serem discriminados e terem medo de voltar a cometer delitos preferem ficar na associação. Como explica Nivalda de Lima, vice-presidente da Apac, mensalmente todos se submetem a exames toxicológicos.
Ao organizar a visita à associação, o professor Rogério Ramos do Prado, responsável pela disciplina de Ética e Responsabilidade Social do MBA, propôs aos alunos que conhecessem uma instituição que desenvolve práticas de responsabilidade social. A questão da sustentabilidade foi observada também com o cultivo de hortaliças e a criação de porcos. Como disse o professor, a visita ensinou mais, foi uma aprendizagem para a vida. “É ver outro lado a que eles [alunos] não estão acostumados; não apenas o empresarial, mas o lado do voluntariado, que é importante.”
Vivenciar para opinarAlunos admitiram sentir vergonha se tivessem que dizer como imaginaram que seria a Apac. Durante as cerca de três horas que permaneceram na instituição, conheceram todas as dependências e acompanharam histórias de vida que mexeram com a emoção.
R.C.S., por exemplo, contou a todos que sua história foi cercada de episódios ligado ao tráfico, assaltos, detenção nos presídios de Formiga e Alfenas. Foi humilhado em muitas ocasiões, até sua internação em uma clínica de reabilitação para drogados. Quando questionado pelo dono da clínica sobre quando deixaria de dar o dinheiro de sua família para traficantes, logo se recordou do que seu pai lhe havia dito: “Eu sou a única pessoa que ainda acredita em você”. Um momento que ele considera crucial na sua mudança de comportamento.
Passou a trabalhar na clínica, ajudando outros pacientes, mas, quando a vida parecia tomar um novo rumo, teve que se apresentar novamente à justiça, por um julgamento anterior, relacionado a um assalto a mão-armada e furto. Ele resume que o causador do seu envolvimento com a criminalidade foi o vício pelas drogas, principalmente o crack. Segundo ele, de 70 a 80% dos presos iniciaram na criminalidade por este vício, passaram a cometer furtos, assaltos e, em alguns casos, homicídios. Hoje ele aconselha os jovens: “Ouçam os conselhos dos seus pais, continuem a estudar, se formem e se afastem das amizades erradas. Porque as amizades erradas e a curiosidade me levaram ao buraco”. E complementa: “O mundo das drogas é cruel, não escolhe classe social, cor, nada. A droga está incluída no meio da sociedade de tal forma que, se não fizer um trabalho de prevenção para ajudar as pessoas, principalmente os jovens, o mundo vai se perder cada vez mais”.
No próximo dia 25 de outubro R.C.S. completa um ano na Apac e tudo que espera do futuro é pagar o que deve à sociedade e cuidar da sua família. “Quero ser um pai de família, minha esposa está grávida de quase cinco meses, já tenho um filho. Pretendo poder cuidar desse filho de que eu fiquei afastado durante todo esse tempo, ele tem 7 anos de idade, e ser um homem honesto, trabalhador, continuar a ajudar as pessoas como já ajudava, esse é o meu objetivo”.
O sentimento de poder retornar à sociedade de forma digna é comum aos recuperandos. Condenado por tentativa de homicídio, A.J.A. aguarda ansioso sair para o regime aberto em 2017. Pretende voltar para sua noiva, a quem diz amar muito e quem sabe regressar ao seu estado natal, Paraíba. Segundo ele, nem sua família sabe que está preso, pois não tem mãe e, desde os 12 anos de idade, como diz, vive no mundo apenas com Deus. A tentativa de homicídio, afirma, foi para se defender de um agressor e que sempre foi um homem trabalhador. Questionado se está arrependido do que fez, confidenciou: “A gente se arrepende. Porque cadeia não é para ser humano não. Vou pagar o que tenho que pagar e pretendo nunca mais voltar”.
“A Apac mostrou que eles [recuperandos] não são presidiários, eles estão se ressocializando, com muita presença de Deus, com muito trabalho”, conclui Larissa de Ávila Barbosa, aluna do MBA.